11 de junho de 2009

capítulo 4. a essência do cinema

“É chegado o tempo da imagem! O cinema dotará os seres humanos de uma nova consciência cinestética: os espectadores ouvirão com os olhos” - Abel Gance (in L`arte Cinématographique - 1927)

Desde o surgimento do cinema como meio, busca-se sua “essência”, seus atributos exclusivos e distintos. Alguns dos primeiros teóricos, como Jean Epstein, reivindicaram um cinema não contaminado pelas outras artes. Outros, como Eisenstein, valorizavam esse diálogo. Nesse cenário, ganham força algumas denominações do cinema: “escultura em movimento”, “pintura em movimento”, “arquitetura em movimento”, “música de luzes”. O denominador comum era a idéia de que o cinema era uma arte.

Nesse sentido, se o cinema era tão bom quanto as outras artes, deveria ser julgado em seus próprios termos. E a França, com suas revistas especializadas e figuras de destaque (Epstein, Delluc, Gance), torna-se um espaço privilegiado para essa discussão. O Manifesto Futurista de 1916 clamava pelo reconhecimento do cinema como uma arte autônoma livre da imitação do teatro. Delluc qualificava o conceito de “fotogenia” como a mais pura expressão do cinema – como a cor está para a pintura e o volume para a escultura – a quintessência inefável. A partir dessa concepção, os críticos impressionistas consideravam que o cinema “não apenas evidencia o movimento poético das coisas no mundo, mas traduz as percepções modificadas da vida humana contemporânea, ou seja, a velocidade, a simultaneidade, a múltipla informação.

O mesmo Delluc referiu-se ao cinema como a “única arte verdadeiramente moderna, por se utilizar da tecnologia com vistas à estilização da vida real”. Para ele, “o movimento e o ritmo compunham a íntima e exclusiva essência da expressão cinematográfica”. Para Gance, o cinema dotaria os seres humanos de uma nova consciência cinestética: “os espectadores ouvirão com os olhos”. Alguns chegavam a considerá-lo como uma experiência corporal e até mesmo sobrenatural. Epstein acreditava na capacidade dessa nova arte de investigar as operações não-linguísticas e não-racionais do inconsciente na existência humana.

Já nesse período, muitos teóricos alertavam contra a tentação do verismo. O cinema deveria abdicar da responsabilidade de contar histórias ou reproduzir realisticamente a “vida real”. O “cinema puro” poderia buscar inspiração, por exemplo, na música e até mesmo nos sonhos.

Por João Marcos Veiga de Oliveira - junho/2009